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Psicanálise, uma pseudociência escondida à vista de todos

Veja aqui a parte dois do artigo sobre a psicanálise com foco na epistemologia.


É muito comum que nós, seres humanos, estudemos alguma disciplina que nos interessa muito e que explica a si mesma em sua totalidade. Dentro de um círculo relativamente fechado de autores anônimos, antigos e renomados, podemos conhecer as teorias mais extravagantes.

Muitos já participaram de alguma forma dessas situações, e talvez nunca tenha ocorrido pensar em buscar alguma crítica ou opinião secundária. A pergunta é: se tivermos tempo o suficiente para analisar essa situação, seríamos capazes de ouvir e raciocinar o que dizem os outros autores sobre o assunto ou como ele é abordado a partir de outras disciplinas?

No caso das pseudociências, a resposta é um enfático “não”. Como costumam defender os seus adeptos:

Aqueles que pensam diferente, tendem a ser parte de uma conspiração e buscam esconder a verdade por algum interesse. Eles são críticos invejosos de nossos ídolos ou simplesmente o detestam por motivos pessoais. Geralmente, fazem parte de ‘outras correntes’ e não precisamos analisá-los mais do que disso. O argumento dele não nos interessa. Talvez não sejamos capazes de mudar de opinião. Talvez, se mudarmos de opinião, anos e anos de estudos iriam-se embora, sem mencionar a chance de ganhar dinheiro, se fosse o caso.

Isso é algo que sabemos mais ou menos e que ficou bem claro na entrevista com o astrólogo Hugo Bonito, neste blog.

Um bom cientista é alguém que busca a verdade e é guiado pela necessidade de encontrá-la. Eventualmente, pode ocorrer a possibilidade de que ele se torne famoso. Um cientista pode trabalhar durante anos em uma teoria, até encontrar evidências que a contradizem. Se os resultados da vida real não correspondem com suas predições, ele vê-se obrigado a reformular o seu postulado ou até a abandoná-lo. Isso independentemente das horas, dias e anos perdidos.

Um falso cientista, ou pseudocientista, irá modificar os resultados de seus experimentos, usando vários truques para justificar sua teoria.

Uma pessoa curiosa e relativamente racional fará perguntas, supondo que ela estará disposta a investigar se você, o cientista, descobriu algo que não é como se pensava. E, eventualmente, ela arriscará a descobrir uma realidade que não coincide com o que se pensava.

A psicologia é uma ciência que estuda os processos mentais, cognitivos e comportamentais dos seres humanos. Dentro dessa disciplina, existem diversas “teorias” e terapias. Uma das mais conhecidas e difundidas é a psicanálise, fundada pelo famoso Sigmund Freud.

A teoria de Sigmund Freud é muito completa e até bela em muitos aspectos, mas, infelizmente, muitos dos seus princípios não têm muito a ver com a vida real. Freud usou métodos duvidosos para realizar seus experimentos, mentiu sobre alguns, plagiou outros e jamais comprovou muitas de suas ideias.

Muitos não sabem que as afirmações feitas por alguns psicanalistas carecem de um bom argumento, pois se tratam apenas de um simples jogo de palavras e de dogmas não verificados ou já refutados.

Existem outras terapias, tal como a cognitiva-comportamental, que é baseada em pesquisas e dados reais e que foram construídos a partir da biologia e das neurociências. Este artigo tenta mostrar várias críticas importantes que a psicanálise recebe e que sugerem que ela seja uma pseudociência.

Já vi críticas às críticas da psicanálise, que se baseavam em discursos como “você é comportamental” ou “a psiquiatria é pior, porque ela usa drogas psicotrópicas”. Fazendo-se um paralelo, os defensores da homeopatia fazem disparates semelhantes em relação à medicina científica (chamada pelos homeopatas de ‘alopatia’). Não se trata de ver qual é o pior ou qual é o melhor, trata-se de ver se eles estão dizendo a verdade, ou se estão mentindo descaradamente (e então a mentira torna-se um dogma, fazendo com que ‘cientistas’ fanáticos se ofendam com a crítica).

O texto a seguir pertence ao Livro Negro da Psicanálise, que foi publicado em uma revista de notícias da Argentina.

A Psicanálise Tornou-se Insignificante

A França, junto com a Argentina, são os países mais freudianos do mundo. Nesses dois países, comumente, admite-se que:

  • Todos os lapsos são “reveladores”;
  • Todos os sonhos revelam inevitavelmente “desejos inconfessáveis” e;
  • Todos os psicólogos são necessariamente “psicanalistas”.

Na França, quando os estudantes preparam seus exames finais do bacharelado, e, ao longo de toda a formação de mestres e professores, as ideias de Freud são ensinadas como verdades inquestionáveis.

De 13 mil psiquiatras, 70% são praticantes da psicanálise ou de alguma terapia de inspiração psicanalítica.

Os freudianos estão firmemente instalados em hospitais e universidades. Nos meios de comunicação, são comumente chamados de “especialistas”. A psicanálise goza de um prestígio evidente.

No entanto, poucas pessoas sabem que essa situação é única no mundo.

No exterior, a psicanálise tornou-se insignificante. A Holanda é a nação que consome a menor quantidade de ansiolíticos. Lá, a matéria é quase inexistente como terapia.

Nos Estados Unidos, apenas 5 mil pessoas são psicanalistas: em relação aos 295 milhões de norte-americanos.

Myers, o manual que serve como uma referência para estudantes de Psicologia (para além do oceano), contém apenas onze páginas dedicadas às teorias de Freud, com 740 acusações.

Existe alguma razão racional para a Argentina e França ficarem sozinhas contra o resto do mundo?

Freud e Cocaína

Por Han Israëls. Historiador da psicologia. Autor de “O caso de Freud. Histeria e Cocaína”.

Em 1884, Freud, que tinha então 28 anos, começou suas experiências com a cocaína, uma substância cujas propriedades e efeitos eram pouco conhecidos na época. Freud queria encontrar algo. Ele tentou usar cocaína como um meio de se libertar do vício da morfina, pois tinha lido em uma revista americana que era possível. Então, ele executa uma experiência com Ernst Von Fleischl-Marxow, um colega e amigo que havia se tornado um viciado em morfina após uma cirurgia dolorosa.

Se o crédito é dado à publicação de Freud, a desintoxicação de morfina foi um sucesso completo. Em 1884, ele escreve que o viciado em drogas em questão – evidentemente, ele não fornece o nome – tinha alcançado imediatamente, graças à cocaína, largar a morfina sem sofrer grandes sintomas de abstinência e, também, dez dias depois, o paciente teria parado de consumir cocaína.

Em 1887, afirmou que era possível curar o vício em morfina através da cocaína e que ele havia participado diretamente do tratamento deste tipo, tendo êxito total.

Mas, em sua correspondência privada, Freud oferece detalhes de uma história muito diferente. (…) Em maio de 1885, um ano após o início do tratamento, Freud escreve em uma carta para Martha, sua mulher, que Fleischl só conseguia sobreviver com ajuda das duas drogas e que tinha sido utilizada uma grande quantidade de cocaína nos últimos meses. O consumo causou uma intoxicação crônica, cujas consequências foram uma insônia severa e uma espécie de delirium tremens. Ele se sentiu tão mal que prometia suicídio após a morte de seus pais.

(…) A lição dessa história é a seguinte: em suas publicações, Freud não tinha nenhum receio em apresentar uma terapia desastrosa como um sucesso retumbante. Um pesquisador que se comunica com seus resultados desta forma não merece ser levado a sério. Só pode ser qualificado como vigarista.

Os Pacientes Imaginários

Por Mikkel Borch-Jacobsen. Filósofo. Autor de sete livros sobre a psiquiatria e a história da psicanálise.

Uma das razões do tempo que seria necessário para obter-se uma ideia mais precisa da eficácia da análise realizada por Freud é que a verdadeira identidade de seus pacientes não era conhecida. Protegidos por sigilo médico, Freud poderia, então, dar-se ao luxo de escrever qualquer coisa, e apenas gradualmente, trilhou-se a caminho da verdade. Com isso, os historiadores foram capazes de identificar as pessoas que estavam escondidos por trás dos nomes “coloridos” de “Elisabeth Von R.”, o “Homem dos Lobos” ou “Pequeno Hans”. (…) O saldo não é convincente.

Senhorita Anna O.: Sabemos que Bertha Pappenheim não foi curada de nenhum sintoma histérico pela “cura pela fala” de Breuer, contrariando as afirmações de Freud. Compreende-se, nessas circunstâncias, que ela estava mais cética em relação à psicanálise: De acordo com o testemunho de Dora Edinger, “Bertha Pappenheum nunca falou desse período de sua vida e se opôs veementemente a qualquer sugestão de um tratamento psicanalítico para pessoas que tinham a seu cargo, para a surpresa dos que trabalhavam com ela.”

Cecilia M.: Seu verdadeiro nome era Anna von Lieben, nascida baronesa de Tedesco. Este paciente foi muito importante e Freud chamava-a de “Mestre” (Lehrmeisterin). Ela sofria também de múltiplos sintomas e excentricidades. Foi também viciada em morfina. De acordo com Peter J. Swales, que foi o primeiro a identificá-la publicamente, seu tratamento com Freud, que durou entre 1887 a 1893, não produziu nenhuma melhoria em seu estado. A filha dela, mais tarde, disse a Kurt Eissler – em entrevista – que a sua família detestava cordialmente Freud (“todos nós o odiávamos”) e que o mesmo paciente pouco se interessava pela “cura pela fala”, mas adorava doses de morfina que seu doutor lhe administrava com liberdade: “A única coisa que esperava dele era a morfina”.

O Pequeno Hans: “A história da doença e da cura” do pequeno Herbert Graf não foi tal que nem a da Aurelia Kronich ou Ida Bauer. Freud e o pai da criança, Max Graf, passaram tesouros do engenho psicanalítico para a cura do que Freud chamou de “fobia de cavalos”, considerando que provia do complexo de castração do pequeno menino. Hebert, que obviamente parecia ter mais bom senso do que seus dois terapeutas, atribuiu seu medo de cavalos e outros animas de grande porte para um acidente de ônibus que tinha testemunhado, durante o qual dois cavalos tinham caído para trás. Nessa segunda hipótese, muito mais simples e prosaica, não é de se admirar o porquê da angústia de uma criança com os animais ter se enfraquecido espontaneamente depois de um tempo. O surpreendente é que Hebert saiu ileso do interrogatório terrível (Édipo-policial) em que seu pai e Freud submeteram-no!

O Homem dos Lobos: No caso de Sergius Pankejeff, podemos avaliar a eficácia a longo prazo de seus dois momentos de análises com Freud, e é rigorosamente zero: sessenta anos mais tarde, Pankejeff ainda era vítima de pensamentos obsessivos e de ataques de depressão profunda, apesar do quase constante monitoramento analítico pelos discípulos de Freud. Esse brilhante sucesso terapêutico foi, na verdade, um fracasso total.

Uma Nebulosa Sem Consistência

Por Mikkel Borch-Jacobsen.

Nós não perguntaríamos o porquê da psicanálise ser tão bem sucedida se estivéssemos convencidos de sua validade. Na realidade, a questão seguinte sugere implicitamente que não acreditemos ou que não devemos acreditar: “Como explicar que uma falsa teoria como a psicanálise teve tanto êxito?”. Para colocá-la de outra maneira: “Como fomos capazes de nos enganar até este ponto?”.

(…) O que há na teoria psicanalítica que a torna capaz de cumprir tantas funções? Nada, na minha opinião. Precisamente porque ela é perfeitamente vazia e oca, esta teoria se propagou como o fez e se adaptou a diferentes contextos. É errado perguntar o que explica o sucesso da psicanálise, uma vez que nunca houve nada como ela, pelo menos, entendida como um corpo de doutrina coerente, organizada em torno de teses claramente definidas e, portanto, potencialmente refutáveis. A psicanálise não existe, é uma nebulosa sem consistência, um branco em movimento perpétuo.

O que há em comum entre as teorias de Freud e as de Rank, Ferenczi, Reich, Melanie Klein, Karen Horney, Imre Hermann, Winnicott, Bion, Bowlby, Kohut, Lacan, Laplanche, André Green, Slavoj Zizek, Julia Kristeva, e Juliet Mitchell? O que há em comum entre a teoria da histeria professada por Freud, em 1895, a teoria da sedução de 1896-1897, a teoria da sexualidade de 1900, a segunda teoria pulsional de 1914, o segundo tópico e a terceira teoria pulsional da década de 20? Suficiente para se referir a qualquer item do Dicionário da Psicanálise de Laplanche e Pontalis para se perceber que a “psicanálise” tem sido, desde o início uma teoria, que se renova permanentemente, capaz de tomar as voltas mais inesperadas.

(…) Freud permitiu muitas vezes mudar suas teorias quando se percebia que estavam invalidadas pelos fatos (Clark Glymour, Adolf Grünbaum), porém ainda se confunde o rigor falseacionista com o oportunismo teórico. Nenhum “fato” era suscetível a refutar as teorias de Freud, pois ele as adaptava com as acusações (objeções) que eram feitas.

A Psicanálise Desapontou Até Mesmo o Freud

Por Isabelle Stengers. Filósofa Belga da Ciência.

No fim de sua vida, no artigo Análise terminável e interminável, de 1937, Freud confessa, em termos muito claros, o fracasso de toda a sua empresa. (…) Ele mostrou, com enorme insistência, que a relação de forças entre o paciente e o analista é desfavorável, no sentido de que tudo o que pode mobilizar contra a resistência do paciente não é suficiente, na maioria das vezes, para derrotá-lo. Em seguida, a técnica psicanalítica não manteve suas promessas e desiludiu o velho Freud, exatamente da mesma forma que a hipnose fez nos tempos de início da psicanálise.

Deste ponto de vista, este artigo faz um ponto à psicanálise, um ponto verdadeiramente final, e se você lê-lo a partir dessa perspectiva, como temos feitos, é algo que se torna bastante evidente.

Taxas sem Escrúpulos

Por Peter Swales. Historiador da psicanálise galês.

Três anos mais tarde (em 1913), em um ensaio intitulado “Novos conselhos sobre a técnica da psicanálise”, Freud aborda a questão das taxas, um tema que ele sempre falhou ao tentar se explicar, por isso, deve ser observado. Foi-se recomendado aos praticantes a adotar, desde o início, uma atitude muito franca. Deveriam concordar expressamente, com ousadia e sem escrúpulos, o suficiente para os potenciais clientes ficarem com a impressão de que o benefício a ser dado a eles tem valor. A “questão irritante” é a da duração do tratamento – uma questão “que, na verdade, é quase impossível de responder”. Freud respondeu que um analista só pode dar garantia de que vai durar “mais do que o esperado pelo paciente”.

Freud argumentou que as taxas elevadas foram justificadas pelo fato de que, qualquer que seja a duração do tratamento, a psicanálise teve seu ponto de partida: a cura da neurose. Por outro lado, é a partir de considerações terapêuticas que ele recomendou essa atitude interessada, afinal de contas, a redução progressiva do poder de compra ou do dinheiro nos bolsos, poderia servir para melhorar na vida. Em virtude deste raciocínio e da ideia de que as taxas permitidas manteriam uma relação entre o médico e seu paciente em um plano estritamente profissional, o psicanalista estava, até então, por força das circunstâncias, impossibilitado de seguir com seus pacientes por caridade, como, de todas as formas, levando em conta o passado, tinha sido fortemente prejudicial para a sua renda.

A conclusão é de que para os pobres foram negados os benefícios da psicanálise. Somente quem fizesse doações em dinheiro receberia os benefícios, e portanto, poderiam se livrar de sua neurose. Tais efeitos Freud afirmava falar com conhecimento de causa.

Durante dez anos, preocupado em revelar os segredos da neurose, ele sempre atendeu a um ou dois pacientes de graça. Então, as coisas tomaram um caráter inevitavelmente pessoal, irreversivelmente arruinando a aliança terapêutica.

Qualquer um pode ser Psicanalista

Por Jacques Van Rillaer. Professor de Psicologia da Universidade de Louvain-la-Neuve, na Bélgica.

Detenhamo-nos um pouco mais sobre o fato de que a psicanálise é uma atividade fácil, que poucas pessoas entendem, exceto aqueles que a têm praticado. No entanto, o próprio Freud disse e repetiu: “A técnica da psicanálise é muito mais fácil de implementar do que se poderia imaginar a partir de sua descrição.” O estado de atenção flutuante, que lidera o modo de como o psicanalista escuta, “permite economizar um esforço de atenção que não se podia manter diariamente por horas.” “Cada um tem, em seu próprio inconsciente, um instrumento com o qual pode interpretar as expressões do inconsciente dos outros.” “O trabalho analítico é uma arte de interpretação, cujo manejo conclusivamente demanda um certo tato e prática, mas não é difícil de aprender.”

(…) Em uma cura, o analista freudiano adota essencialmente três tipos de atividades:

1. Escutar o estado de atenção flutuante, ou seja, sem o esforço de atenção;
2. Emitir regularmente “hummmm”, para assegurar o cliente de que você está ouvindo e que tem interesse em continuar a associar “livremente” temas freudianos e;
3. De vez em quando, fazer interpretações, às vezes compreensíveis, às vezes enigmáticas.

A decodificação psicanalítica é muito simples: em grande parte, consiste em separar as palavras – chamadas “significantes” – e em apontar analogias ou significados simbólicos. Isso é acessível a qualquer pessoa que completou o ensino secundário e que leu alguns livros de psicanálise. Quando o cliente faz perguntas embaraçosas, você só precisa retornar o controle, “Por que você pergunta isso?”, “O que chama a isso?” Etc. Suas críticas e oposições são interpretadas como “resistências”, “negações” ou manifestações de uma “transferência hostil”. Nunca se referem ao analista em questão.

Qualquer um pode ser autorizado como “psicanalista” e exercer este trabalho, que não tem status legal. Desde que a psicanálise se tornou bem sucedida, muitas pessoas têm-na praticado sem ter estudado psicologia ou psiquiatria.

[Nota 01: obviamente que esta última alegação não está correta em relação a todos os países. Na Argentina, por exemplo, os psicanalistas têm de ser psicólogos. A Facultad de Psicología de la Universidad Nacional concentra quase que exclusivamente a psicanálise, o que levou ao epistemólogo Mario Bunge chamá-la de “Facultad de Ciencias Ocultas“.]

A Tática do Jargão Incompreensível

Por Jacques Van Rillaer.

Os freudianos – principalmente na França – utilizam fórmulas bonitas e se jactam de uma vasta cultura literária e filosófica. As instâncias de Lacan citam muito a Platão, a Goethe, a Poe, conhecem algum mito antigo e obviamente falam de alguns poetas surrealistas. Mas não há de deixar-se intimidar, e é útil lembrar, segundo o eminente epistemólogo Gaston Bachelard, que “a paciência do erudito não tem nada a ver com a paciência científica”. Outro modo de enganar com falsas aparências é o uso de um jargão incompreensível. Esse tipo de linguagem oferece segurança intelectual porque torna a doutrina aparentemente “irrefutável” (a qualquer objeção, pode-se responder: “Você não compreendeu nada”; “A verdade analítica é outra, está em todas as partes”), promove mistificações (fazendo passar simples acrobacias verbais por novas contribuições ao saber), facilita o abuso do poder e da exploração financeira e proporciona intensas satisfações narcisistas. Para não deixar que riam da gente, convém ler a análise feita por Erwin Goffman dos procedimentos de mistificação do público. Citemos suas conclusões:

“Como mostram inumeráveis contos populares e inumeráveis ritos de iniciação, o verdadeiro segredo detrás do mistério é, frequentemente, que na realidade não há mistério; o verdadeiro problema radica em impedir que o público também o conheça.

(…) Lacan explorou, sem sentir vergonha, a tática das interpretações sibilinas. Os alunos-analisadores intentavam, em grupo, decodificar suas palavras. Jean-Guy Godin escreveu, no diário da sua análise didático com o mestre parisiense:

“Com certeza, a estratégia – digamos o cálculo de Lacan – era um dos nossos temas de conversação regular nesse bistrô onde estávamos; já que suas intervenções apresentavam sempre um lado enigmático, algo impronunciável: se podia apostar com certeza sobre a presença de intenções ou sobre a ausência de segundas intenções?

Para seus admiradores, Lacan podia produzir qualquer associação livre e dizer qualquer coisa: eles se encarregariam, depois, de lhe proporcionar um sentido, um sentido profundamente bem compreendido.

[Nota 02: Situação semelhante às interpretações da Glossolalia em algumas comunidades religiosas.]

As Mentiras de Freud

Por Frank Cioffi. Epistemólogo norte-americano autor de “Freud e a Questão da Pseudociência”.

Sigmund Freud pode ter sido um grande homem, mas não era, por isso, um homem honorável. Grande pela imaginação e a eloquência, desonrou-se ao dirigir um movimento dogmático num interesse do qual nunca deixou de perjurar. É possível que tenha sido ferido, alguma vez, pela sua tendência a renegar dos seus ideais.

(…) Dentre as mentiras de Freud, podem-se citar as seguintes: que descobriu o complexo de Édipo sobre a base de falsas lembranças de sedução paterna; que existia uma vez uma jovem chamada Anna O.; que sua teoria da sexualidade tem sido confirmada pela observação direta que empreendeu das crianças e; que não tinha nenhuma ideia preconcebida em relação à influência da sexualidade quando começou a analisar seus pacientes, pelo que a suposta corroboração não pode ser devida à sugestão.

(…) Alguns reconhecem as mentiras de Freud, mas as perdoam em virtude de verdades que não foram, no entanto, transmitidas e de suas consequências benéficas. Este raciocínio não é novo. Um historiador norte-americano, escandalizado pela negação de Speer a admitir que estava informado sobre a solução final (dos nazistas) e persuadido de que tinha mentido quando recusou-se a assistir uma conferência sobre o tema, teria modificado o informe dos debates, de forma que Himmler parecia dirigir-se diretamente a Speer. Um filósofo da ciência canadense concedeu a Freud as mesmas circunstâncias atenuantes:

Freud, como muitos teóricos enciumados, sem dúvidas falsificou as provas em função da teoria. Freud demonstrou um compromisso apaixonado pela Verdade, a verdade profunda, subjacente, em quanto a valor. Este compromisso ideológico é totalmente compatível com o fato de mentir como um sapador, e até pode inclusive exigi-lo.

A Psicanálise Cura?

Por Jean Cottraux. Psiquiatra francês. Diretor da unidade de tratamento da ansiedade do hospital da Universidade de Lyon.

Exploração indefinida ou cura das mentes com problemas? Disciplina rainha do conhecimento de si mesma ou método terapêutico? Desenvolvimento pessoal ou terapia? Os psicanalistas souberam aproveitar essa ambiguidade notavelmente. Quando pergunta-se-lhes sobre a eficácia da terapêutica, respondem que seu objetivo último é o conhecimento de si mesmo. Quando exige-se-lhes que justifiquem os conhecimentos que adquiriram por este método, dizem que a prova brilhante é os seus resultados terapêuticos e que esses se medem com a vara dos testemunhos de cada caso definitivamente curado. A essa dupla linguagem, acrescenta-se, às vezes, a arrogância frente aos demais tratamentos psicológicos e farmacológicos. Os últimos orientam a tratar, mas não a curar. A psicanálise mudaria as estruturas mentais enquanto que os outros métodos não fariam mais do que deslocar os sintomas.

No entanto, os capítulos deste livro [O livro Negro da Psicanálise] não permitem afirmar que a cura seja muito frequente na psicanálise, mesmo nas mãos particularmente esclarecidas do pai dela. O mito da substituição dos sintomas nas outras formas de psicoterapia, particularmente das terapias cognitivo-comportamentais, tem percorrido um longo trecho.

Nos nossos dias, a questão dos resultados da psicanálise agita não somente ao mundo dos psicanalistas, mas também ao grande público. Esse último está mais bem informado e desejoso por compreender o que lhes espera no divã e também quer avaliar as alternativas de um método longo e custoso.

Desde as origens, questionaram-se a Freud mais a pouca eficácia do seu método do que as suas ideias, seus juízos banais e próximos aos de Charcot e Janet, do que . Durante o século XX, a controvérsia continuou apesar da marcha triunfal da psicanálise. Desde os anos sessenta, os questionamentos têm sido, em especial, mais numerosos e tem levado ao advento de outras formas de psicoterapia na maioria dos países democráticos, em particular Estados Unidos e nos países de Europa. Não aconteceu o mesmo na França, que segue sendo, com a Argentina e o Brasil, um dos bastiões da influência psicoanalítica quase sem comparação até os dias de hoje.

Vítima da Análise

Por Annie Gruyer. Se “psicanalisou” durante sete anos.

Em uma terça feira de setembro de 1992, coloquei um ponto final a sete anos de terapia de inspiração psicanalítica. Eu acabava de fazer vinte anos. Lembro-me do imenso alívio que senti esse dia: tinha a impressão de que estava me desprendendo de uma espécie de labirinto onde eu vagava há anos, sem nenhuma finalidade exata, sem conseguir estar segura de que um dia encontraria uma saída. Eu me sentia liberada, mesmo quando não tinha resolvido nenhuma das minhas dificuldades. Mesmo assim retomava meu caminho com os mesmos sofrimentos, as mesmas perguntas no ombro.

(…) Centro hospitalar, consulta externa, uma segunda feira às dois da tarde. Iniciei minha primeira entrevista em terapia cognitiva-comportamental (TCC). O médico psiquiatra que me recebeu começou imediatamente o diálogo. Perguntou-me por que tinha vindo, quais eram minhas dificuldades. Expliquei-lhe as minhas perturbações e que coisas invalidavam-me na vida cotidiana. Depois de ter me feito algumas perguntas, me disse isto:

“Através de tudo o que você me explicou, eu posso lhe dizer que tudo o que você descreve leva um nome: agorafobia acompanhada de uma perturbação pânica. É importante que você saiba que eu entendo o que sofre, e que você não está sozinha neste caso. É uma fobia conhecida e que pode ser tratada. Podemos ajudá-la.

Sete anos limpados numa sessão. Sentia-me aliviada, leve: eu não estava louca, eu não era a única em sentir essas terríveis crises de angustia, eu poderia me livrar delas. E, agora, me sentia apoiada. (…) Em 18 meses, fiz progressos que não imaginava que fossem possíveis. Então, existiam outras terapias além da psicanálise! Enfoques sem um Gran Mestre todopoderoso nem discípulos fanáticos. Para mim, a solução veio da TCC. Para outros, vai significar uma outra forma de tratamento. Hoje, o importante já não é fazer do paciente uma vítima, um ser passivo ao que se deixa sem acabar, num sintoma que seria “somente” a parte visível do iceberg… que cada pessoa que sofra possa ser aliviada prioritariamente de suas perturbações e sintomas por médicos e psicólogos que dialogam e que tratam. Cada doente, mesmo no terreno da saúde mental, tem direito a um diagnóstico, a uma explicação do enfoque proposto pela terapeuta. O fim de um tratamento deveria ser o alívio do sofrimento e a autonomia do indivíduo numa “aliança terapêutica” e humana. É uma questão de saúde pública.

A Psicanálise Sabotou as Mães

Por Violaine Guéritault. Psicóloga. Autora de “A Carga Emocional e Física das Mães”.

Durante décadas, a psicanálise se dedicou a sabotar esse frágil lugar que a sociedade dos homens tinha deixado à mulher: seu papel materno, a transmissão, com a vida, do amor, da educação dos primeiros anos. Durante milênios, as mulheres tinham sido consideradas inferiores aos homens, exceto no domínio familiar, no qual se reconhecia sua competência e seu valor. Com a psicanálise, já não lhes resta nem sequer esse espaço.

Durante muito tempo, os Estados Unidos contribuíram a popularizar essas teorias de culpa da mãe até que a corrente de pensamento freudiana perdeu progressivamente seu vigor nos anos oitenta e noventa. (…) A psicologia moderna compreendeu que o psiquismo humano não era um parque de diversões no qual alguém pode se permitir enunciar pseudoverdades sem ter provas tangíveis daquilo que se postula. O drama psicológico que, durante anos, viveram centos de mães de esquizofrênicos ou autistas, acusadas dos piores delitos se baseando somente na fé outorgada a um punhado de psiquiatras, resulta tanto mais inadmissível se atendermos ao fato de que a investigação científica tem demonstrado, hoje, que essas graves perturbações são, em grande parte, de origem neurofisiológica. Que consequências trágicas trouxe a culpabilidade intransigente de estas mães? Quantas mães têm vivido com a convicção de que eram monstros incapazes de amar verdadeiramente a seus filhos? Quantos dramas familiares e vidas estragadas?

(…) Daria a impressão que, na França, as mães são sempre consideradas perigosas para seus filhos e, ainda, mortíferas. Tal como a Rainha da Noite, em A flauta mágica, de Mozart, que quer tirar sua filha Pamina da influência do seu pai, o sábio Sarastro, elas enlouquecem em gritos histéricos e devastadores. Não estamos falando de alguns casos abusivos, de algumas mães: não! São AS mães em geral, TODAS as mães. Onde estão os estudos, as investigações? Sobre o que descansam estas peremptórias acusações?

Os Mitos Sobre a Homossexualidade

Por Pascal de Sutter. Psicólogo e sexólogo. Chefe de Sexologia do Hospital de Waterloo, Canadá.

Freud enunciou teorias muito refutáveis sobre a homossexualidade. Não duvida em citar a Iwan Bloch para afirmar que a homossexualidade “está extraordinariamente difundida em numerosos povos selvagens e primitivos”.

De onde vem, então, que a chame de uma “perversão”? Da mãe, provavelmente… Segundo a psicanálise, ela é, com frequência, a causa dos problemas. “Entre todos os homossexuais, existiu na primeira infância, esquecida mais tarde pelo indivíduo, uma relação erótica muito intensa com a pessoa feminina, geralmente a mãe, suscitada ou favorecida pela ternura excessiva da própria mãe, reforçada também pela retirada do pai na vida da criança”, ele escreveu.

E se um homossexual afirma que sua mãe não suscitava uma ternura excessiva, Freud vai dizer que a “esqueceu”. Convenhamos, no entanto que, para Freud, não somente os pais se sentem questionados: a acentuação do erotismo anal também seria um fator que favoreceria a predisposição.

O erotismo anal é uma ideia que volta inúmeras vezes nos escritos dos sucessores de Freud. Isso alude evidentemente à prática da sodomia. Mas não é ridículo vincular o fenômeno da homossexualidade a uma simples prática sexual (que por outro lado não concerne a todos os homossexuais, nem é praticada por todos eles)? Seguindo a mesma lógica, pode-se dizer que as mulheres que praticam a felação têm uma fixação com o erotismo oral!

(…) Freud estava impregnado das concepções do seu tempo, uma época na qual se considerava às mulheres como inferiores, aos homossexuais como perversos e às crianças como a seres aos quais somente uma sólida educação podia conduzir pelo caminho correto. Era a sua, apesar de tudo, uma luz liberal num oceano de obscurantismo? Podemos duvidá-lo se consideramos que na sua época vivia Havelock Ellis (conhecido, por outro lado, por Freud, que o cita algumas vezes). (…) Ellis estimava que a homossexualidade podia ser considerada como uma simples variação estatística, ideia totalmente escandalosa para a sua época. Freud, muito mais conformista, a classificava entre as perversões.

[Nota 03: Algumas pequenas alterações ortográficas foram feitas para facilitar a compreensão.]


Fonte

Ezequiel Del Bianco. El Psicoanálisis, una Pseudociencia Escondida a la Vista de Todos. Alerta Pseudociencias. 6 de maio de 2010.

[Tradução da introdução autorizada pelo autor original.]


Leituras Recomendadas

Catherine Meyer. O Livro Negro da Psicanálise: Viver e Pensar Melhor sem Freud. 2011.

[Este livro reúne artigos, entrevistas e depoimentos de 23 autores que questionam a eficácia da análise, a duração dos tratamentos sugeridos pelos psicanalistas e os conceitos de Freud.]

Michel Onfray. O Crepúsculo de um Ídolo, a Fábula Freudiana. 2010.

[Expõe os pontos mais controvertidos da história da psicanálise, desde os mitos da história “oficial” psicanálitica, as práticas de censura, etc.]

Carlos Santamaría y Ascensión Fumero. El Psicoanálisis ¡Vaya Timo! Laetoli. 2008.

Mario Bunge. Las Pseudociencias ¡Vaya Timo! Laetoli. 2011.

Karl Popper. Conjecturas e Refutações. 1963.

André Luzardo. O Atraso das Ciências Humanas no Brasil: Psicanálise. Sociedade Racionalista da Universidade de São Paulo. 17 de janeiro de 2011.

Jacques Van Rillaer. As Ilusões da Psicanálise.

[A avaliação crítica da psicanálise freudiana, sua técnica de interpretação, métodos e teorias.]

Hans Eysenck. A Grandeza e Decadência do Império Freudiano.

Mikkel Borch-Jakobsen e Sonu Shamdasani. The Freud Files.

Ernest Jones. Vida de Sigmund Freud.

Algumas páginas recomendadas:

  1. A página dos críticos de Freud. Resenha de artigos e livros com uma vasta crítica a Freud e suas teorias.
  2. A página de Richard Webster. Historiador e crítico da Psicanálise com vários textos sobre Lacan e Freud.
  3. Página de Frank Sulloway. Um dos pioneiros da crítica a Freud. Há alguns artigos de acesso livre.
  4. Os pacientes de Freud. Artigos de Borch-Jakobsen sobre os pacientes de Freud.
Douglas Rodrigues Aguiar de Oliveira

Douglas Rodrigues Aguiar de Oliveira

Divulgador Científico há mais de 10 anos. Fundador do Universo Racionalista. Consultor em Segurança da Informação e Penetration Tester. Pós-Graduado em Computação Forense, Cybersecurity, Ethical Hacking e Full Stack Java Developer. Endereço do LinkedIn e do meu site pessoal.