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A jornada de Alexandre, o Grande – Parte II

Leia: parte I e parte III

2. Infância e ascensão ao trono

Para entendermos a personalidade de Alexandre, duas coisas precisam ser observadas. A primeira diz respeito à educação formal que ele recebeu, sobretudo na infância e na adolescência; a segunda, às proezas que ele realizou enquanto governante. Desde a meninice, quando ainda era sonhador, Alexandre recebeu treinamentos rigorosos por parte de seus preceptores. Por influência de Olímpia, ele começou a acreditar que descendia de memoráveis ídolos do passado, tais como o glorioso Aquiles, da Guerra de Troia, e o mítico Hércules, filho de Zeus. Julgamentos supérfluos o rotulam tanto de diabólico, megalomaníaco e até psicótico, quanto de benevolente, heroico e libertador. A verdade é que ele tinha uma natureza dividida em dois espíritos diferentes: seu lado culto, literato e amante da cultura grega convivia com o destemido guerreiro que urrava dentro de si. Apreciar as belas artes, valorizar o conhecimento e a filosofia não o prejudicava no manuseio das armas contra seus inimigos, nem o impedia de demonstrar-lhes clemência.

Mas o que fez Filipe investir tanto no amadurecimento intelectual de seu filho? A princípio, havia aí algo muito oportuno. A única condição capaz de firmar o elo pan-helênico era através de uma liderança familiarizada com os costumes e o idioma grego. Por isso, ao completar 13 anos de idade, Alexandre viajou para Mitilene de Lesbos, onde ingressou numa das academias de Aristóteles, considerado hoje um dos homens mais extraordinários do mundo. Como Filipe havia destruído Estagira, terra natal de Aristóteles, ele prometeu restaurá-la e libertar da escravidão seus sobreviventes em forma de pagamento pelas instruções que o filósofo prestaria a seu filho. Simpatizado com o novo pupilo, o sábio mentor logo o presenteou com um exemplar da Ilíada, de Homero, que ao longo da vida Alexandre adotou como uma Bíblia. Foi no transcorrer dessa temporada como aprendiz que ele conheceu Heféstion, Ptolomeu, Eumênio e outros amigos vitalícios que, mais tarde, seriam feitos conselheiros e generais até o fim do império.

Enquanto isso, as incursões diplomáticas de Filipe pela Grécia começavam a fervilhar. As cidades de Atenas e Tebas, suspeitando das intenções políticas dos macedônios, conjecturaram a iminência de sofrerem um golpe de Estado, e mantiveram-se inflexíveis até entrarem em guerra contra o velho rei. Filipe, então, escalou Alexandre, que havia deixado a escola aristotélica aos 16 anos, para liderar um pelotão de ataque naquele confronto. A importante vitória macedônica, nesta que ficou conhecida como a Batalha de Queroneia, subjugou os tebanos e atenienses à nova coalizão engendrada por Filipe, e não tardou para que outras cidades-estados, temendo o tropel do exército vitorioso, se rendessem à sua crescente campanha. Quando as coisas pareciam dar certo, um infortúnio ocorreu em 337 a.C.

Em Aigai, durante uma celebração matrimonial entre Cleópatra, irmã caçula do jovem Alexandre, e Alexandre de Épiro, irmão de Olímpia e membro da dinastia eácida, Filipe foi apunhalado por Pausânias, integrante de sua própria guarda pessoal. Entretanto, antes que o assassino pudesse se esconder, um grupo de soldados reais o matou no local em que ele foi capturado, impossibilitando, assim, que se fizessem interrogatórios sobre as motivações do crime. Por causa disso, os mistérios desse regicídio até hoje permanecem insolúveis. Uma das hipóteses sugere que Pausânias, quando estava embriagado, foi cercado por estupradores – soldados de um homem chamado Ário, aliado do rei. Diante de tamanha desgraça, pugnou pela abertura de investigações que esclarecessem o caso e punissem os culpados, mas foi friamente ignorado pelo soberano, razão pela qual vingou-se dele.

Há quem suspeite de um complô entre algumas cidades-estados gregas refratárias à incipiente campanha de Filipe. No entanto, fosse isso plausível, Alexandre teria sido eliminado na mesma ocasião, já que era sucessor do trono e também presenciava o casamento da irmã. A mais controversa de todas as hipóteses acusa o próprio Alexandre de se mancomunar com Pausânias para executar seu pai e assumir o tão pretendido trono. Apesar de escandalosa, essa parece ser uma explicação aceitável, pois é possível que tenha existido certo ressentimento entre eles por causa de fases demasiado turbulentas que haviam atravessado, algumas tão graves que até culminaram no banimento temporário de Alexandre. Seja qual for a verdade oculta na história, o fato é que Alexandre, em 336 a.C., aos 20 anos de idade, apoderou-se do trono e tornou-se o novo rei da Macedônia, e estava decidido a terminar o que seu pai começou. Daquele dia em diante, a sorte de toda a Grécia estaria em suas mãos.

Ricardo Silas

Ricardo Silas

Estudante de História (UFRB), 25 anos.