Pular para o conteúdo

Turquia retira o ensino de evolução do currículo escolar

O ministério da educação turco, anunciou em Janeiro desse ano uma medida na qual elimina das escolas secundárias o ensino da teoria da evolução. Apesar do governo abrir uma consulta sobre o tema, onde a maior parte da população rechaçou a proposta, o presidente Recep Erdoğan ignorou  a opinião da população e manteve a retirada da Teoria da Evolução da grade escolar.

A medida de Erdoğan é um duro golpe no racionalismo, abrindo espaço para o fortalecimento da ignorância científica do povo turco. Essa postura sinaliza uma  aproximação de Erdoğan a posições que convergem com o  fundamentalismo Islâmico.

A exclusão do ensino da Teoria da Evolução também ocorre nos territórios controlados pelo estado Islâmico.  Nas regiões do Iraque onde o EI (Estado Islâmico) tem o controle territorial tudo o que faz referência à teoria darwinista da evolução foi banido das aulas de Ciências. Isso se deve, segundo representantes do E.I, ao fato que: “toda a criação se deve a Deus, o Altíssimo”. Além disso, disciplinas como arte e música, história e geografia e literatura foram excluídos da grade curricular nos territórios ocupados.

A ação do governo turco gerou revolta por parte de cientistas e educadores.  O cientista Cagatay Tavsanoglu, presidente da Sociedade Turca de Ecologia e Biologia Evolucionária, escreveu carta para revista Nature¹ denunciando a alteração e pedindo à comunidade científica internacional apoio para o retorno da disciplina ao currículo das escolas turcas.

Segundo Cagatay Tavsanoglu: “A estratégia proclamada da Turquia de alcançar excelência nas ciências biológicas e médicas deve ser apoiada por um forte programa educacional em biologia evolucionária”, escreveu Tavsanoglu. “O entendimento da teoria evolucionária é crucial para resolver desafios contemporâneos, como a perda da biodiversidade. Princípios evolucionários abasteceram avanços em muitos campos, incluindo agricultura, medicina, farmácia e nanotecnologia”.

A compreensão da Evolução é muito mais do que um mero conhecimento para saber como chegamos até aqui. Apesar de saber como chegamos até aqui ser algo extraordinariamente fascinante, compreender os mecanismos evolutivos possibilita a aplicação em inúmeros processos práticos como medicina, conservação de espécies, dentre outros.

Por exemplo, por sabermos que as espécies evoluem, nosso combate contra bactérias prejudiciais tem uma abordagem que seria completamente diferente, caso elas não evoluíssem. Sabemos que o uso de antibióticos provoca uma pressão seletiva, no qual seleciona positivamente bactérias que evoluíram para apresentar resistência aos antibióticos. O resultado prático é a produção de novos medicamentos e a orientação correta, pois o uso indevido pode relaxar as pressões de seleção fazendo com que mais bactérias evoluem as tornando mais resistentes.

No entanto, o combate a Teoria da Evolução por parte dos fundamentalistas religiosos não se dá por uma mera insipiência intelectual mas, sim, por um mau-caratismo que propaga a ignorância a fim de criar as “condições ideais” para poder tirar vantagem de pessoas em situação de desespero ou fragilidade emocional. Não é a toa que todo fundamentalista religioso ataca fortemente a Teoria da Evolução, isso porque ele sabe que compreender como as espécies evoluíram durante milhões de anos coloca em cheque a “principal obra de seu Deus”: a vida. Assim, consequentemente tem sua autoridade enfraquecida como “representante direto de Deus.”

Infelizmente essa cruzada contra a razão também ocorre no Brasil. O deputado federal Marcos Feliciano (PSC) é autor de um projeto para que tenha o ensino do criacionismo em alternativa ao ensino da Evolução nas escolas brasileiras. Além disso, o projeto Escola Sem Partido está propondo que: “VII – Direito dos pais a que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com as suas próprias convicções”. Assim, caso os pais reivindiquem que filho aprenda criacionismos e não ciência na escola o estado deve garantir que as escolas virem um anexo das igrejas.

Mas a versão Estado Islâmico tupiniquim vai além. Em um recente discurso o Jair Bolsonaro afirmou:  “Deus acima de tudo. Não tem essa historinha de Estado laico não. O Estado é cristão e a minoria que for contra, que se mude. As minorias têm que se curvar para as maiorias”. Na prática, o que ele diz não se diferencia em nada do fundamentalismo Islâmico, apenas com uma leve diferença, uns falam em nome de Ala, outros em nome de Jesus. A aparência muda, mas o conteúdo é o mesmo de ignorância e intolerância.

Nessa cruzada dos fundamentalistas contra a Teoria da Evolução, nossas principais armas são a popularização do conhecimento e a defesa firme das liberdades individuais. Em nenhum momento propomos o fim da religião, a liberdade de culto deve ser preservada. No entanto, o que nos opomos radicalmente é que religião seja ensinada nas disciplinas de ciências ou que uma instituição de um estado laico, no caso uma escola, se transforme em correia de transmissão de uma visão religiosa específica.

Até porque se for para ensinar criacionismo nas escolas precisamos responder: que criacionismo será ensinado nas escolas? O Cristão, budista, islã, judaico, o criacionismo dos povos Indígenas ou das tribos africanas ou quem sabe o do Paganismo nórdico?

Referências

Tavsanoglu, Cagatay. “Education: Restore evolution to Turkey’s curriculum.” Nature 542.7640 (2017): 165-165.
Lucas Sena

Lucas Sena

Mestre e doutorando em Genética e Biologia Molecular pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).