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Pode a função de onda de um elétron ser dividida e capturada?

Artigo original por Kevin Stacey do Phys.org

Nova pesquisa por físicos da Universidade Brown coloca a profunda estranheza da mecânica quântica em uma casca de noz – ou, mais precisamente, em uma bolha de hélio.

Experimentos  liderados por Humphrey Maris, professor de física na Brown, sugerem que o estado quântico de um elétron – a função de onda – pode ser despedaçada em partes, e essas partes podem ser capturadas em pequenas bolhas de hélio liquido. Para serem claros, os pesquisadores não estão dizendo que podem quebrar o elétron. Elétrons são partículas elementares, indivisíveis e inquebráveis. Mas o que os pesquisadores dizem é de certa forma ainda mais bizarro.

Na mecânica quântica, partículas não têm uma posição distinta no espaço. Ao invés disso, elas existem como uma função de onda, uma distribuição de probabilidade que inclui todas as localizações possíveis onde a partícula pode estar. Maris e seus colegas estão sugerindo que partes dessa distribuição podem ser separadas e isoladas umas das outras.

“Nós estamos capturando a chance de encontrar o elétron, não partes do elétron,” Maris disse. “É um pouco como a loteria. Quando os bilhetes são vendidos, cada que compra ganha um papel. Então todos ganham uma chance e você pode considerar que as chances estão espalhadas pelo lugar. Mas só há um prêmio – um elétron – e para onde o prêmio vai só é determinado depois.”

Se a interpretação de Maris de suas descobertas estiverem corretas, elas levantarão questões profundas sobre o processo de medição na mecânica quântica. Na formulação tradicional da mecânica quântica, quando uma partícula é medida – quando é detectada em uma posição específica – se diz que a função de onda colapsou.

“Os experimentos que fizemos indicam que a mera interação de um elétron com um sistema físico maior, como um banho de hélio líquido, não constitui uma medição,” disse Maris. “Então a questão é: O que constitui?”

E o fato de que a função de onda pode ser dividida em uma ou mais bolhas é igualmente estranho. Se um detector encontra o elétron em uma bolha, o que acontece com a outra?

“Isso realmente levanta todo o tipo de questão interessante,” disse Maris.

A nova pesquisa foi publicada no Journal of Low Temperature Physics.

Bolhas de elétron

Cientistas se perguntaram por anos sobre o estranho comportamento de elétrons em hélio líquido próximo do zero absoluto. Quando um elétron entra no líquido, ele repele os átomos de hélio próximos, formando uma bolha de aproximadamente 3,6 nanômetros de diâmetro.

Nos experimentos, um pulso de elétrons entra em um tubo com hélio, e um detector registra a carga elétrica emitida quando bolhas de elétrons atingem o fundo. Devidos às bolhas terem um tamanho definido, elas deviam todas experimentar a mesma quantidade de resistência conforme se movem, e deveriam portanto chegar ao detector ao mesmo tempo. Mas não é o que acontece. Experimentos detectaram objetos não identificados que chegam ao detector antes das bolhas normais de elétron. Ao longo dos anos, cientistas catalogaram 14 objetos diferentes com tamanhos distintos, todos se movem mais rápido do que a bolha de elétron.

“Eles são um mistério desde que foram detectados pela primeira vez,” disse Maris. “Ninguém tem uma boa explicação.”

Muitas possibilidades foram propostas. Os objetos desconhecidos podem ser impurezas no hélio – partículas carregadas das próprias paredes do recipiente. Outra possibilidade é a de que os objetos possam ser íons de hélio.

Mas Maris e seus colegas, incluindo Leon Cooper, físico da Universidade Brown e laureado ao Nobel, acredita que uma nova sequência de experimentos possa trazer mais explicações.

Novos experimentos

Os pesquisadores executaram uma série de experimentos com a mobilidade das bolhas de elétron com muito mais sensibilidade do que nas tentativas anteriores. Eles conseguiram detectar todos os 14 objetos do trabalho anterior, e mais quatro que aparecem em sequência. Mas em adição aos 18 objetos que apareceram mais frequentemente, o estudo revelou inúmeros objetos adicionais que apareceram mais raramente.

Na verdade, disse Maris, parece que não são apenas 18 objetos, mas um número efetivamente infinito deles, com uma “contínua distribuição de tamanhos” até o tamanho normal da bolha de elétron.

“Isso coloca uma navalha na ideia de que eram impurezas ou íons de hélio,” disse Maris. “Seria muito difícil imaginar que haveriam tantas impurezas, ou tantos íons de hélio previamente previamente desconhecidos”.

A única maneira que os pesquisadores puderam pensar para explicar os resultados seria através da “fissão” da função de onda. Em certas situações, os pesquisadores supõe, a função de onda do elétron pode se quebrar ao entrar no líquido e partes dela são capturadas por bolhas. Devido às bolhas conterem menos do que uma função de onda inteira, elas são menores do que o elétron normal e se movem mais rápido.

Em seu novo artigo, Maris e sua equipe usam usam um mecanismo cuja fissão pode acontecer e é suportada pela teoria quântica e corrobora com os resultados experimentais. O mecanismo envolve usar um conceito na mecânica quântica conhecido como reflexão sobre a barreira.

No caso dos elétrons e hélio, funciona assim: Quando o elétron acerta a superfície do hélio líquido, há alguma chance dele submergir, e alguma chance dele ser refletido. Na mecânica quântica, essas possibilidades são expressas como parte da função de onda submergir, e parte ser refletida. Talvez as bolhas de elétron pequenas são formadas por uma parte da função de onda que submerge através do líquido. O tamanho da bolha depende de quanto da função desce, isso explicaria a distribuição contínua do tamanho das bolhas nos experimentos.

A ideia de que parte da função de onda é refletida em uma barreira é mecânica quântica comum. Cooper disse. “Não posso pensar de ninguém que possa discordar disso,” ele disse. “A parte não-comum é de que parte da função de onda que atravessa e tem um efeito físico influenciando no tamanho da bolha. Isso é o que é novo aqui.”

Adicionalmente, os pesquisadores propõe que o que acontece após a função entrar no líquido. É como colocar uma gota de óleo em um pote de água. “As vezes sua gota de óleo forma uma bolha,” disse Maris, “As vezes forma duas, as vezes 100.”

Existem elementos dentro da teoria quântica que sugerem uma tendência da função de onda se quebrar em tamanhos específicos. Pelos cálculos de Maris, os tamanhos específicos que alguém possa esperar ver correspondem aproximadamente aos 18 tamanhos mais frequentes.

“Nós achamos que isso oferece a melhor explicação para o que vimos nos experimentos,” disse Maris. “Nós temos esse corpo de dados há 40 anos. Os experimentos não estão errados; eles foram feitos por várias pessoas. Nós temos uma tradição de usar a Navalha de Occam, onde tentamos usar a explicação mais simples. Essa, até agora, é a mais simples.”

Mas isso levanta algumas questões interessantes que ficam na fronteira entre a ciência e a filosofia. Por exemplo, é necessário assumir que o hélio não faz uma medição da atual posição do elétron. Se fizer, qualquer bolha em que o elétron não estiver, em teoria, desaparece. E isso, disse Maris, aponta para um dos maiores mistérios da teoria quântica.

“Ninguém tem certeza do que constitui uma medição. Talvez físicos possam concordar que alguém com Ph.D vestindo um guarda-pó branco sentados em um laboratório de uma universidade famosa possa fazer medições. Mas e alguém que não tenha certeza do que está fazendo? A consciência é necessária? Realmente não sabemos.”

Luis Henrique Troscianczuck

Luis Henrique Troscianczuck

Atualmente cursando o ensino médio, sonho com o dia em que a divulgação científica atingirá a todos. Meu objetivo atual é terminar o ensino médio e conseguir cursar Física em uma boa universidade.